Há 150 anos, instalava-se o primeiro cabo telegráfico submarino do Atlântico Sul, que ligaria a capital pernambucana de Recife a Lisboa, em Portugal, possibilitando a primeira conexão do Brasil à rede global de comunicações em tempo real. Graças à inovação, as notícias não mais precisariam percorrer os mares em navios e demorar cerca de três a quatro semanas para o intercâmbio de informações.

Não é uma coincidência que os dois primeiros jornais nacionais que publicaram uma notícia estrangeira recebida pelo telégrafo elétrico, em 23 de junho de 1874, dia seguinte à instalação, foram pernambucanos: o extinto Jornal do Recife e o Diário de Pernambuco, que existe até hoje. Ou seja, os “furos internacionais” eram naturalmente dados por veículos recifenses pelo fato do estado ser o primeiro porto no qual os navios vindos da Europa aportavam ao se aproximar da costa brasileira.

De acordo com a Revista Pesquisa Fapesp, a primeira página do Jornal do Recife, de 23 de junho de 1874, celebrava a novidade: “Estamos, pois, em comunicação instantânea com o mundo inteiro, e já ontem mesmo se trocaram alguns despachos particulares com a praça de Londres”.

“A inauguração do cabo telegráfico submarino em 1874 foi uma verdadeira revolução na comunicação para o Brasil e, por extensão, para a América do Sul” afirmou o jornalista Pedro Aguiar, também professor pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador sobre a história das agências de notícias no Brasil, em entrevista a Opera Mundi.

Segundo Aguiar, a nova tecnologia expandiu os horizontes do mercado brasileiro. Ela permitiu com que a economia nacional pudesse se integrar ao sistema econômico da Europa, assim como também facilitou a comunicação internacional para questões diplomáticas.

“Isso integrou a economia brasileira ao capitalismo financeiro europeu, especialmente britânico, acelerando os investimentos, os créditos e, portanto, as dívidas de empresas e fazendeiros brasileiros com credores de Londres e outros centros do capitalismo imperialista. Também significou um contato mais rápido na diplomacia, evitando atritos como a Questão Christie (1861-1862), causada em grande parte pela demora na comunicação internacional”, explicou o pesquisador.

A implementação de uma conexão por meio do cabo telegráfico também fazia parte do interesse europeu, dado que “conectar nosso continente era estratégico para os interesses imperialistas” e, também, “como foi mais tarde para os norte-americanos”.

“O cabo ligava não só o Brasil, mas na prática toda a América do Sul à rede global de comunicação já instalada desde a década de 1850 pelas potências europeias”, lembrou Aguiar.

Como funcionava o telégrafo?

As informações no telégrafo eram enviadas por meio de fios de cobre e, neles, eram transmitidos impulsos elétricos, como se fossem pequenos choques. As frequências eram codificadas numa combinação entre impulsos longos e curtos.

“Você criava um código para transformar esses impulsos curtos e longos em pontos de linhas. Cada conjunto de pontos e linhas correspondia a uma letra. Esse é o código morse, que o Samuel Morse criou nos Estados Unidos, e ele era, inclusive, dono de jornal. Então por meio do código morse, as pessoas conseguiam decodificar a mensagem quando recebiam”, explicou Aguiar.

Como os fios de cobre eram desencapados e, para ficarem instalados dentro do mar, precisavam de várias camadas protetoras. Eles eram cobertos por camadas de panos e outros materiais isolantes. O principal componente protetor era uma espécie de resina parecida a uma borracha, mas que era derivada de uma planta asiática chamada guta-percha.

A atualidade no caminho do passado

Segundo o pesquisador, chama a atenção como os cabos de fibra óptica da internet na atualidade seguem praticamente “os mesmos caminhos e a mesma concentração dos cabos de telégrafo há 150 anos”. No entanto, observa a novidade que é a ligação entre a Ásia e os Estados Unidos, por meio do Oceano Pacífico.

“Não existia em 1901, mas é muito evidente em 2013”, indicou Aguiar, explicando que a ausência da conexão no século 19 se deve aos “acelerados crescimentos do Japão e da China”.

“Nos dois mapas você vê grandes linhas no Atlântico Norte, ligando os Estados Unidos e a Europa. Poucas linhas entre os continentes do norte e do sul. Um forte fluxo pelo Oriente Médio até a Índia. O que muda mesmo de um para o outro é a ligação Ásia-EUA pelo Oceano Pacífico, que não existia em 1901 mas é muito evidente em 2013”, destacou, justificando como as conexões intercontinentais quase ficaram inalteradas mesmo após tanto tempo.